segunda-feira, novembro 16, 2009

O JARDIM PÚBLICO DE PENICHE TAMBÉM TEM A SUA HISTÓRIA

Por: Fernando Engenheiro
Quem percorrer a extensa cinta de muralhas que separa a península de Peniche do seu istmo arenoso apercebesse-se de que os baluartes que a integram (com rasgos criados na sua parte superior para colocação de artilharia e avançando sobre o fosso criado no exterior daquela cintura) se encontram ligados por espessos e elevados muros denominados “cortinas”. É do espaço adjacente à “cortina” que une o Baluarte da Misericórdia (também denominado quando da sua construção por Baluarte de S. João da Marinha) e o Baluarte da Ponte (que também foi conhecido por Baluarte de S. Pedro) – o nosso Jardim mais antigo - que vou falar hoje.
Foi precisamente entre aqueles dois baluartes que Nicolau de Langres, autor do projecto de construção das nossas muralhas, previu a criação da entrada principal desta então praça militar.
Assim, quando da construção daquele muro, foi deixado ali espaço para o portão da entrada, ficando preparada a soleira onde assentariam os umbrais para a colocação das meias portas. Do exterior das muralhas são bem visíveis os vestígios desta soleira.
A criação desta entrada tratava-se de uma obra de grande envergadura para a época, pois que o seu acesso implicava a travessia do fosso na sua parte mais larga com uma extensa ponte com quinze arcos. A execução do plano aprovado foi, por isso, aguardando uma oportunidade que nunca chegou.
Entretanto resolveram, a titulo provisório, alterar o projecto de modo a que o acesso não fosse tão dispendioso. Assim a entrada foi aberta mais a norte (já no Baluarte da Ponte) onde hoje é conhecida por "Ponte Velha".
Resolvida esta questão, embora com uma solução, em princípio, transitória, todo aquele espaço que estava destinado para a entrada da praça militar ficou ao abandono, sempre à espera de melhores dias.
Era designado por "Morraçal”, por se tratar de uma zona lamacenta, onde as águas das chuvas permaneciam sem qualquer saída e que servia de vazadouro público e para descanso de animais de carga.
As Câmaras de então olhavam para aquele precioso espaço com vontade de o explorar em proveito dos munícipes, mas a Lei não o permitia por se tratar de zona interdita, afecta à defesa militar.
Havia na época grande interesse em criar na povoação um passeio público, onde houvesse uma zona de lazer para os seus habitantes. A área mais cobiçada para o efeito era sem duvida o "Morraçal de Peniche de Baixo".
Só foi possível a concretização deste desejo pelo bom entendimento do Barão do Casal, José de Barros Abreu, que, assumindo o lugar de Governador desta Praça a 21/10/1833, deu todas as facilidades para que se levasse avante o sonho dos seus habitantes.
Ainda naquele ano comparticipou nas despesas, bem como muitos moradores desta Vila, com donativos e materiais necessários para a obra de construção dos muros de vedação. Logo que foi possível mandou-se semear em todo ele plantas adequadas ao recreio do público e salubridade dos ares. Em 1837 procedeu-se a uma grande sementeira de pinheiros da Suécia.
Com a entrada de um novo governador a 7/12/1838, Coronel de Engenharia Joaquim Pedro Pinto Sousa, o assunto mudou de figura pois havia que legalizar o terreno perante o Ministério da Guerra.
Em sessão camarária de 26/4/1839, confirmando a sua petição, a Câmara Municipal tomou conhecimento de uma Portaria expedida pelo Ministério da Guerra, 2ª. Repartição, do dia 8 do mesmo mês, com o seguinte teor:
"Sua Majestade mandou comunicar ao Governador desta Praça em resposta ao dito oficio seu de 26 de Março que há por bem permitir à Câmara Municipal deste Concelho a plantação no terreno do Morraçal com o fim de estabelecer um Passeio Público, devendo porém lavrar termo pelo qual se obrigue a restituir aquele terreno quando se concluir a fortificação naquele ponto".
Ao longo de anos este recinto manteve-se encerrado ao anoitecer, com a presença dum soldado do Batalhão de Veteranos da Praça, que a Câmara gratificava com doze mil reis anuais.
Continuaram ali as plantações: em 1840 vieram de Lisboa árvores de amoreiras (livro de despesa da C.M.P., 1839/1841, fls. 24).
Mais tarde, em sessão camarária de 12/1/1860, foi deliberado criar uma Comissão Directória e Conservadora do Passeio Publico desta Vila, nomeando para Presidente, Vogal e Tesoureiro, respectivamente, Joaquim Antero da Costa, Joaquim José Tavares e Bento da Costa Perdigão.
Depois de longos anos daquele espaço como estabelecimento de jardim público havia que lhe dar uma nova aparência, com nova disposição dos canteiros e plantação de novas arvores. Porém só era possível a sua remodelação com a anulação de diversos morros de pedra que não tornavam possível colocar tudo no mesmo plano. Depois de petição feita pela Autarquia foi, a 25/8/1884, autorizada pelo Ministro da Guerra a exploração da pedra naquele recinto.
O mesmo não aconteceu na mesma época, a 21/8/1884, com a construção do coreto, para a qual a Edilidade concedeu autorização ao então Secretário da Câmara José Acúrcio Nunes Rego de Carvalho, sem que as entidades que superintendiam naquele espaço se tivessem pronunciado.
Havia grande interesse em dar àquele recinto um ambiente cada vez mais agradável e, assim, a pedido da Autarquia, deslocou-se a Peniche um botânico francês ao serviço do Museu Nacional de Lisboa - Jardim Botânico, com o fim de estudar as plantas resistentes ao nosso clima.
Depois dos seus estudos, foi informado o Município, a 26/4/1883, de grande número de plantas que aqui resistiriam, o que foi uma informação de grande interesse para o fim em vista.
No dealbar do século vinte, no local onde estava planeada a construção de um edifício para escola de rendas, foi implantado um imóvel destinado a sede do Clube Recreativo Penichense. Para isso foi necessário derrubar uma vasta zona de frondosas árvores que cobriam toda aquela área. A Câmara Municipal, não querendo perder esta receita, resolveu em sessão ordinária de 3/8/1900 mandar fazer editais para a venda das árvores cortadas fixando a licitação para o dia 26 do mesmo mês, pelas 11 horas da manhã.
Poucos anos depois, a 20/2/1905, foi resolvido mandar arrancar as pilastras do muro de vedação e vender todo o gradeamento em madeira ali existente. Foi arrematante José Pereira da Costa, pela quantia de 3.600 réis.
Havia que continuar com o embelezamento do local e com a plantação de novas árvores, assunto tratado em sessão ordinária da C.M.P. de 28/1/1907. Houve na altura um benemérito, Senhor Francisco Nunes Branco, proprietário residente nesta Vila, que ofereceu umas palmeiras e mais arbustos com o fim de aformosear o passeio público (trata-se das palmeiras ainda ali existentes em frente da Praça Jacob Rodrigues Pereira).
A Edilidade, com toda a justiça, fez lavrar o agradecimento na acta da sua sessão de 18/11/1907.
Pelo seu grande movimento, justificava-se ter exclusivamente ao serviço naquele espaço um guarda-jardineiro, bem como o aumento de número de bancos e a melhoria da iluminação, o que teve a sua concretização em 1923.
Também para apoio dos seus frequentadores, em 18/3/1929, foi deliberado pela Câmara Municipal construir ali retretes públicas para homens e senhoras. Foi autor do projecto o então jovem penichense Arquitecto Paulino Montez.
A Comissão de Iniciativa de Peniche, lutando pelo desenvolvimento turístico da zona, apercebendo-se da falta de um campo de ténis nesta Vila, sobretudo para o entretenimento dos visitantes na época balnear, solicitou à Câmara Municipal a cedência para o efeito de terreno no jardim público. Atendendo a que a concessão vinha trazer benefícios para o turismo da nossa terra, foi o pedido deferido em sessão camarária de 10/8/1936.
Também um lago era um atractivo para os visitantes e, assim, em 27/5/1937, foi aprovada a sua construção. A obra foi entregue a um particular, o empreiteiro José Henriques, pela quantia de trezentos e setenta escudos.
Em 13/7/1939 foi autorizada pelo Poder Autárquico a exploração de uma esplanada no Jardim Público, por conta do Café Aviz, que lhe ficava em frente, tornando-se mais aprazível o local especialmente na época balnear.
Mais tarde, em 1948, foi o referido espaço explorado por Alberto Pereira, Américo Sales, Alberto Monteiro de Melo e Floriano Matoso, conforme contrato com o Município celebrado a 30/7/1948, com direito a exibirem actos de variedades artísticas. Não foi além de três épocas, pois que aquele espaço foi preenchido em 1951 com um Parque Infantil, com vigilante.
Além de todo este movimento, na década de 40 ali se realizaram “verbenas”, também designadas por “Feiras de Verão”, com diversões diversas, em prol do Grupo Desportivo de Peniche e do Hospital da Misericórdia.
Só a partir de 1971 é que aquele espaço (a parte norte do Jardim) estabilizou com a construção de um edifício para exploração de bar-esplanada, tendo adjacente as dependências de um novo Posto de Turismo. O projecto foi elaborado pelo Arquitecto Manuel Ferrão de Oliveira, por deliberação de 16/6/1971. Em 26/7/1972, conforme escritura lavrada no Livro de Notas n.º 23 do Notariado Privativo do Município, foi adjudicada a concessão da exploração do bar-esplanada, por 10 anos, a José Maria dos Santos, funcionário de organismo de coordenação económica, e Rodrigo da Cunha Velho, comerciante, residentes em Peniche.
Extinto o bar, presentemente neste espaço funciona uma Escola de Rendas de Bilros, administrada pela Câmara Municipal, mantendo-se o Posto de Turismo criado em 1972.
APONTAMENTOS DIVERSOS:
Em 1953, durante a Presidência de António da Conceição Bento, para rectificação do traçado das ruas que ladeiam o Jardim, foi derrubado todo o muro de vedação edificado em 1929 na Presidência de António Maria de Oliveira, muro que possuía bancos em alvenaria na zona fronteira da Praça Jacob Rodrigues Pereira e duas amplas entradas com arcos coroados por telhas verdes de barro vidrado. O muro foi substituído por uma sebe de arbustos.

1 comentário:

Anónimo disse...

Pois esta informação do edifício no jardim municipal como café esplanada e os nomes de José Maria dos Santos(meu tio e padrinho e,Rodrigo da Cunha Velho,meu conhecido e amigo)está correctíssima.Dado que trabalhei no local cerca de 10 anos,extensivos ao espaço da exploração também camarária no parque de campismo de Peniche.Aires Manuel (facebook).