quarta-feira, outubro 30, 2013

SOLDADOS DA PAZ COM SEDE EM PENICHE

 
Texto: Fernando Engenheiro
    
    A necessidade de preservar a continuidade das espécies tem sido, ao longo dos tempos, uma constante preocupação do homem. Acompanhando a evolução da técnica e o crescente número de riscos, o homem procura criar meios que lhe sirvam de protecção e conservação do seu meio. O reconhecimento da acção destruidora do fogo levou os nossos antepassados a precaverem se contra os efeitos catastróficos dos incêndios. Assim, os hebreus e os gregos criaram as vigias nocturnas encarregados de efectuar rondas e dar o sinal de alarme em caso de perigo. Missão idêntica havia na antiga Roma.
   Em Portugal, corria o ano de 1395 que a primeira carta régia sobre o assunto é expedida pelo então soberano D. João I, “de Boa Memória” assim chamado pelo que deixou no mundo de suas acções ilustres. Nela se estipulava um sistema de vigilância nocturna e aviso às populações, através dos pregoeiros, alertando para os cuidados a ter com o lume em suas casas. Foram também definidas normas de actuação para extinção de incêndios e vigilância contra os roubos frequentes nestas ocasiões. Desde então e até aos nossos dias foram várias as reformas e os melhoramentos introduzidos neste serviço indispensável para o bem da humanidade. No entanto, o caminho percorrido foi moroso e difícil. Nem sempre a existência de meios era suficiente para fazer face às necessidades.
    Em relação a Capital do Reino, determinava que, em caso de incêndios, todos os habitantes, homens e mulheres, tinham de correr em socorro, munidos de machados, cântaros, potes e outros instrumentos que facilitassem o combate ao fogo. É este documento considerado a primeira ordenação que estabelece regras empíricas para apagar incêndios. Embora nele se determine a colaboração da população, essa ordenação não é mais do que um apelo ao voluntariado e à solidariedade que deve estar presente nos momentos de tragédia. Só mais tarde, porém, já na quarta dinastia, reinando o soberano D. João V, o rei cognominado por “Magnânimo’ por lhe não parecer difícil nenhuma coisa, que empreendia, e pela grandeza de suas acções, foi introduzido uma prática de combates aos fogos, baseados em experiências realizadas em França com resultados satisfatórios, com base na grande invenção para a época, das bombas de incêndios, decorrida no ano de 1722.
Criada então a Companhia de Incêndios, transformada mais tarde em Corpo de Bombeiros foi, no entanto, por iniciativa de Guilherme Cossoul (1828-1880), que se instituiu a primeira associação de bombeiros que no voluntariado tinha a sua razão de ser. Foi assim que, de época para época, numa evolução permanente, com a força de vontade de alguns e o espírito de servir de muitos, que se foram criando os alicerces e consolidando as estruturas dessas heróicas corporações de voluntários. Constituem hoje o fulcro, o dinamismo e a força dessas altruísticas Associações de Bombeiros Voluntários formadas por homens desinteressados e íntegros, que sabem dar-se na protecção e defesa do semelhante.
   Em Peniche, não se sabe ao certo a data em que se criou uma instituição visando a defesa dos haveres e vidas dos cidadãos em caso de fogo, embora tomamos em consideração, tal acto de servir o povo de Peniche, tivessem a cargo dos membros aquartelados na Fortaleza, na defesa da Península, conforme documentos de uma época que comprovam a sua actuação. “Documento lavrado em ata a 20 de Julho de 1873 que se refere a um oficio do Governador da Praça Conselheiro Joaquim Ferreira Sarmento, nos seguintes termos: Pedindo à Câmara lhe dispense, para guardar a Bomba de apagar incêndios, numa casa que esta Câmara possui na Rua da Palha, por ser mais central e no interior da povoação. A Câmara, em vista das ponderações feitas pelo dito Governador, concedeu a casa pedida para o fim indicado’.’
   Tratava-se de uma dependência na actual Rua 13 de Infantaria, pertencente ao Município, onde funcionou a antiga “Casa da Fanga” (celeiro municipal), vendida pela Câmara Municipal a um particular, Emídio Balbino, por escritura lavrada a seu favor em 1905. Passados 12 anos, a 14 de Março de 1885, no impedimento do major da praça, Manuel Ferreira Bret, o tenente-ajudante da mesma guarnição militar manda à Câmara Municipal uma cópia daquele oficio, vinculando ou talvez renovando a continuação daquela cedência a favor dos serviços militares. Não se sabe quando deixaram de exercer estas funções, assim como se desconhece também rigorosamente o seu começo.
   Havia que tomar algumas previdências para que se criasse um corpo de bombeiros pois os incêndios eram frequentes. De salientar o incêndio deflagrado de 13 para 14 de Fevereiro de 1922, às 22h00, no armazém de redes das Armações do Romina, construído em madeira e localizado no exterior da muralha, no ângulo da muralha a norte, junto à entrada por Peniche de Cima. Outro ocorrido, em 28 de Outubro de 1926, na mercearia de José do Rosário, em Peniche de Cima, de que resultou perda total do seu recheio. Havia assim a grande necessidade de criar em Peniche, de apoio também ao seu concelho, uma corporação de bombeiros, a exemplo das sedes de concelho vizinhas, que nos auxiliavam bastante em casos de emergência. Nesse sentido, em sessão camarária de 4 de Junho de 1929, presidida por António Maria de Oliveira, tendo como colaboradores os vogais Joaquim Guilherme Fana Júnior e Miguel Olavo Franco, foi tomada a seguinte deliberação: “O Sr. Presidente lamenta que não exista em Peniche uma corporação de bombeiros e reconhecendo também que a Câmara não possui rendimentos que lhe bastem para criar uma corporação de bombeiros municipais, propõe que a comissão Administrativa desta Câmara tome a iniciativa da organização de tão útil quão benemérita instituição de forma que ela seja um facto dentro de pouco tempo. Propõe mais, que para esse fim a Comissão Administrativa nomeie uma comissão Organizadora que ficara sob o seu patrocínio a quem serão entregues as verbas que a Câmara for metendo nos seus orçamentos ajudando assim a criação deste corpo de bombeiros. Aprovado por unanimidade’.
   Não tardou que naquele mesmo mês, no dia 16, fosse criada oficialmente a Associação dos Bombeiros Voluntários de Peniche, tomando em consideração os poucos rendimentos que a Câmara Municipal possuía para formar uma corporação de Bombeiros Municipais, o que acarretaria avultadas despesas que não estavam ao alcance da autarquia. Foi a sua primeira sede instalada no edifício dos Paços do Concelho, no rés-do-chão, funcionando no andar superior o actual salão nobre. Foi a primeira direcção constituída por António Maria de Oliveira (presidente), Aires Henriques Bolas (secretário), José Júlio Cerdeira (tesoureiro), António Adelino Gomes da Silva e António Nunes Ribeiro (vogais). Entretanto, ingressou como comandante António Adelino Gomes da Silva, que ficou a chefiar inicialmente os seguintes bombeiros residentes na área da jurisdição da sede do concelho: Manuel António Malheiros, Inácio Luís Ceia, José Rosado do Rio, José Maria Cartaxo, António Martins, Casimiro da Costa, António Diogo da Costa, Inácio Maria de Abreu, Mário Nobre Leitão, Joaquim Rodrigues Tormenta, José Inácio Bandeira, Jacinto Inácio de Sousa, Lino Filipe Franco, Rui Dias Loureiro, Reinaldo Gomes, Ângelo Gaspar da Mata, Manuel dos Santos Correia, José de Carvalho e Silva, José Maria das Neves, Joaquim Miguel Sousinha Júnior Quintino Augusto de Lemos, José Maria de Abreu, Joaquim Leal Paulo, José Pedro Júnior. Estes elementos desempenhavam as mais diversas profissões, tais como: carpinteiros da construção civil e de machado pedreiros, calafates, bem como empresários dos mesmos ramos, marceneiros, entre outros.
    A autarquia, logo no começo da sua organização, foi solidária em tudo aquilo que lhe foi possível e estava ao alcance das suas possibilidades financeiras. Também o Comando Militar da Praça de Peniche pôs à disposição as dependências da cidadela, bem como os terraços para as instruções, formaturas e tudo o que estivesse ao abrigo da sua competência militar. Não tardou que, a 16 de Julho de 1930, viram partir da vida presente o grande impulsionador desta obra, a quem a morte não deixou ver o êxito completo da sua nobre iniciativa, motivado por uma tuberculose óssea, aos 45 anos de idade, falecendo na sua residência, na Rua Dom Luís de Ataíde em Peniche, António Maria de Oliveira, que tomou posse na Comissão Administrativa da Câmara Municipal em 11 de Março de 1929, com pouco espaço nas suas atribuições que duraram até 29 de Abril de 1930, acumulando as funções de presidente da Comissão Municipal de Assistência. Figura de elevado carácter, nascido na então vila do Barreiro na freguesia de Santa Cruz, a 12 de Janeiro de 1885, jaz depositado no Cemitério Municipal de Santana em Peniche, em mausoléu mandado edificar pela Câmara Municipal.
    O seu substituto, para poder desempenhar cabalmente e com eficiência a sua elevada missão, havia que providenciar a aquisição de apetrechos, mas o dinheiro era escasso. Assim, no primeiro ano e noutros que se seguiram, para angariar receitas, realizaram-se quermesses e verbenas, no jardim público principal, jogos de futebol, gincanas, bailes, cinema, apresentaram-se grupos dramáticos organizaram-se festas diversas, incluindo a da “Flor’ e até vacadas. Peniche e a Associação dos Bombeiros Voluntários em 30 de Setembro de 1932, quis na interessante festa que a Comissão “Pró Bombeiros” promoveu no recinto do Jardim Público, na então vila de Peniche, nas noites de 11, 12, 13, 17, 18 e 19 de Setembro de 1932, agradecer a todos quanto contribuíram para a realização de tais festividades, que só foi possível com a grande colaboração dada pelas digníssimas senhoras: Beatriz de Bellegard Bello, Maria Emília Belo Dias, Adelaide Ferreira B de Carvalho Oliveira, Felicidade Rosa Mendes, Heloisa Jordão Vidal de Carvalho, Beatriz Andrade, Clotilde Sampaio Sena, Jovite Ângela de Abreu Trindade, Graziela da Fonseca Martins, Berta da Fonseca Martins, Sofia da Fonseca Martins, Olga Reis, Maria de Lourdes Bello, Maria Antónia Belo Dias, Maria Emília Santos Conceição, Maria da Graça Henriques, Ricardina Amaral, Lídia Andrade, Violeta Andrade, Maria Thereza Stichaner Roth, Lúcia Parreira, Aura Figueiredo de Magalhães, Ruth Paúrcio Vidal de Carvalho, António Nunes Ribeiro, José Júlio Cerdeira e José do Nascimento Ginja. Com toda a boa vontade dos participantes rendeu esta festa, 11.951$58, sendo um grande contributo para os apetrechos de incêndios a favor daquela instituição. Também todas as receitas em posse da Comissão Pró-Monumento a Jacob Rodrigues Pereira, por ter sido posta de parte a ideia da sua construção, reverteram a favor dos bombeiros (continua no próximo número).
ssos e Maria Cristina Parreira. E, também, a Comissão Pró-Bombeiros, constituída pelos excelentíssimos senhores: Joaquim Fana Júnior, Armando Sampaio Sena, António Adelino Gomes da Silva, António Luiz Pereira Montez, Tenente Rosa Mendes, Alberto Monteiro de Proença, Doutor José Bonifácio da Silva, Carlos Henrique Tavares Freire de Andrade, Doutor Carlos Henrique Graça, Aires Henriques Bolas, José Lopes, João Couceiro, António Mateus Dias, José Ac