sexta-feira, agosto 23, 2013

Limpeza, Higiene e Saneamento Básico em Peniche



O grande passo que Peniche conquistou ao longo dos anos.



São poucas as pessoas que se lembram de Peniche de outros tempos, com referencia ainda a nos princípios do segundo quartel do século passado, só nos resta os conhecimentos dos elementos que nos ficaram. Temos que dar a mão a palmatoria, ao recordarmos a passagem por Peniche, em Agosto 1919, do escritor Raùl Brandão, autor do livro “ Os pescadores”. No seu desabafo, fazendo referência à pouca higiene desta península, dizia: “ Peniche é horrível, cheira que tromba”. Em contrapartida, de visita à ilha do Baleal, escrevia: “que é a mais linda praia da terra portuguesa”. O escritor deu uma no cravo e outra na ferradura para não ficarmos muito magoados. Não vou discutir o que era Peniche na época, mas ao que tenho conhecimento, Raul Brandão não deixa de ter razão, declarações que possivelmente não apanharam a municipalidade de surpresa.
Na presidência municipal de Luís Maria Freire de Andrade, no triénio de 1923 a 1925, pela necessidade de tornar a zona da Ribeira mais asseada, visto que em dias de elevado movimento de pesca, este ponto da vila se tornava quase intransitável, agravado ainda com os despojos que vinham dos diversos armazéns da preparação de peixe que não possuíam os necessários esgotos, pensou a autarquia em mandar construir um colector geral que partindo do ponto mais alto, designado por peça, da então Rua Almirante Reis ( actual Avenida do Mar), fosse desaguar ao mar no porto designado por “De Revés”. Com a realização desta obra solucionou-se o problema com o saneamento da Ribeira, com a canalizações largas em alvenaria cobertas com lajedos arrancados na nossa costa.


No que diz respeito a limpeza e a higiene, Peniche estava bem longe de ser uma vila modernizada e limpa.Precisávamos, no entanto, afirmar que havia boa vontade da parte de todos os habitantes, na coadjuvação deste importante e grave problema. Na época dada as circunstâncias precárias e as dificuldades de instalação de uma rede de esgotos da vila, havia a grande necessidade de fazer desaparecer, para sempre, as estrumeiras junto das portas e dentro das habitações. Também era de toda a necessidade que algumas mães educassem os seus filhos para que deixassem de fazer na rua, junto das portas das habitações, as necessidades fisiológicas, sem respeito algum pelos mais rudimentares princípios de limpeza, de educação e de moral, transgredindo assim as posturas municipais, em que destaco o Código de Posturas da Câmara Municipal de Peniche, aprovado em sessão da Comissão Distrital de 10 de Dezembro de 1913, no capitulo XXIII da higiene e Salubridade Pública. Era preciso respeitar, pondo em prática o referido código, acabar de vez com o péssimo hábito de varrer o lixo e outras imundices para a rua, quando este devia ser reservado em caixotes tapados até podendo ser, evitando assim a aglomeração do então infernal mosquedo, e os quais todos os dias da manhã se colocavam às portas das habitações para serem recolhidos pelo pessoal da limpeza ao serviço do Município e despejado nas respectivas carroças do lixo, então na época puxadas por um macho.

Em continuação com os velhos usos e maus costumes da época, era preciso, finalmente, pôr termo ao vergonhoso e repugnante espectáculo dos grupos de certas mulheres que, sem respeito algum pelos habitantes e por quem nos visitava, se entretinham, nalguns pontos até mais frequentados da vila, despiolharem-se com o maior descaro, atestando, assim, a sua grande falta de asseio, tanto corporal como espiritual.


No meio de todos estes cumprimentos a exigir da população o melhor sentido de viver, procurando recursos mais favoráveis à saúde em geral, havia também que pôr mãos à obra das condições sanitárias necessárias para assegurar a qualidade de vida da população, através da canalização dos esgotos para usos domésticos, com o desempenho das águas pluviais que lhes serviria de descarga na limpeza das canalizações, direito ao mar . Foi a partir de 1942, na presidência da Câmara Municipal de José Bonifácio da Silva, que a firma 'Fábricas Jerónimo Pereira Campos & Filhos', com sede em Aveiro, forneceu à autarquia, manilhas de grés cerâmica e acessórios destinados à rede de esgotos de Peniche. Foi o referido contrato assinado com a firma fornecedora a 9 de Julho de 1942, pela importância de 311.673$45, depois da deliberação camarária tornada em sessão no dia 2 daquele mês e ano, cuja a obra só foi possível pelo empréstimo feito daquela importância à Caixa Geral de Depósitos, com sede em Lisboa, entidade que muito contribuiu para as obras das autarquias. Por todo o espaço destinado ao assentamento de manilhas e caixas de derivação, foi difícil o trabalho executado com a força dos braços dos seus executantes, depois de extraírem toda a pedra encontrada todo longo do percurso no subsolo. As despesas foram avultadas, o que obrigou a um trabalho demorado e por zonas, a incluir nos orçamentos municipais para os anos que se seguiam.

O presidente da municipalidade que se seguiu, José da Mota Coutinho Garrido, deu o grande arranque durante o seu mandato, quase exclusivamente preenchido com aquela obra de grande interesse para Peniche, onde também foram incluídas as águas pluviais, com valetas nos arruamentos e sarjetas para receberem as águas da chuva, ao mesmo tempo e no mesmo percurso do assentamento das manilhas, se procedeu à destruição dos sumidouros particulares e públicos, além dos canos parciais e sifões. Também o presidente que se seguiu, António da Conceição Bento, a partir do seu mandato, a 4 de Agosto de 1946, deu continuação às obras de saneamento com grande desenvolvimento, atendendo a grande evolução da construção de bairros sociais e particulares, com o rasgar de novos arruamentos e ao mesmo tempo substituição das antigas manilhas de grés por outras em cimento de maiores dimensões, justificando a grande evolução populacional que Peniche estava a sentir.


Até então continuava-se a fazer todos os despejos para o mar em todas as direcções. Todo o núcleo habitacional da baixa de Peniche tinha o seu percurso direito ao fosso da fortaleza, vulgarmente conhecido por Doca, com diversas saídas na muralha. Junto a prainha de S. Pedro, na esquina do Baluarte, na entrada principal para a Fortaleza, funcionou por longos anos uma pia larga de despejo para os particulares que não tinham esgotos nas suas próprias habitações, resolvendo assim a muitas mulheres o problema com um pote – também vulgarmente conhecido por azado – em que ao fim do dia despejavam os dejectos. A parte alta da vila também tinha o seu problema resolvido com o esgotar para o carreiro fedorento, na costa sul.



Foi já no dealbar do século que novos rumos foram criados a favor do saneamento na cidade de Peniche, que passo a descrever um pequeno resumo:” A nova Estação de Tratamento de Águas Residuais ( ETAR) de Peniche, foi oficialmente inaugurada a 29 de Agosto de 2001 numa cerimonia presidida pelo ministro do ambiente, José Sócrates, na presença de Jorge Resende Gonçalves, então a frente dos destinos do Município e outras entidades civis e militares”. Esta estação tem a capacidade de tratamento para mais de 46 mil habitantes e inclui uma unidade de tratamento de gorduras provenientes de gorduras das industrias conserveiras locais, considerada a maior da Europa, uma obra com um custo global de cerca de um milhão de contos, 75% dos quais comparticipados por fundos comunitários e os restantes 25% pela autarquia.





Texto & Fotos: Fernando Engenheiro





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