terça-feira, novembro 19, 2013

Soldados da Paz com Sede em Peniche III

Por: Fernando Engenheiro
Pela primeira vez o benemérito e brioso corpo activo da Associação dos Bombeiros Voluntários de Peniche quis agradecer ao segundo- comandante dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras e comandante da Corporação de Peniche, Paulino Pereira, atribuindo a medalha de ouro como reconhecimento de todo o esforço desempenhado na conduta de instrutor desta corporação, sem qualquer remuneração nas suas presenças e deslocações a esta então vila, durante dois anos, deixando todos os soldados da paz aptos no desempenho das suas atribuições. Assim, foi deliberado em acta da sessão ordinária de 5 de Novembro de 1933 o seguinte: propunha que, a exemplo do que fizeram outras associações que dele receberam igual favor da sua valiosa instrução, se mandasse cunhar uma medalha de ouro com o escudo desta associação, tende no reverso a legenda “Honra do valor” da qual se lhe faria entrega naquele dia, acompanhada do respectivo diploma. A direcção aprovou por unanimidade o alvitre, que partiu também do nosso segundo comandante, vogal António Adelino Gomes da Silva, que se encarregou de mandar cunhar a referida medalha e desenhar o aludido diploma.
A luta por fazerem mais e melhor era constante e a acção dos bombeiros não se ficava só pelos incêndios, As grandes tarefas de socorro que se apresentavam no dia-a-dia, cada uma com o seu
problema especifico, fez sentir àqueles soldados da paz a necessidade de melhor se apetrecharem, confrontados muitas vezes com situações de perigo no combate a incêndios, ficando eles próprios sujeitos a traumatismos, queimaduras, asfixia e, em alguns casos, afogamentos. Assim, cedo se aperceberam das suas carências no campo da saúde. Mas não são só os incêndios que clamavam a sua presença. O naufrágio conta com eles para salvar a vida; o ferido confia na sua assistência; o doente vê nele alivio para os seus males; o invalido considera-o o seu complemento.
Têm sido muitos os naufrágios ao longe dos tempos ocorridos na nossa costa, auxiliados por este grupo de voluntariado. Lembro aqui o navio inglês “Ingland Hope’ da empresa Nelson Laine, ocorrido no Farilhão a 19 de Novembro de 1930, embora com poucos recursos não deixaram de prestar auxilio em receberem os náufragos e
dando-lhes a devida assistência; o navio espanhol “Fernando Ibarra” naufragado em Vale de Janelas a 20 de Dezembro de 1943, que fez a oferta a esta colectividade humanitária de 1.500$00 pelos serviços prestados; o vapor francês “Henry Mory” abicado na Papôa a 6 de Outubro de 1931, deram o seu contributo possível no auxilio aos tripulantes; “João Diogo’ navio português encalhado na Papôa a 8 de Janeiro de 1963, também lhes prestaram todo o auxílio ao seu alcance; e tantos outros que o tempo apagou mas que na memória dos membros que contribuíram nestas façanhas nunca estão esquecidos, recheados das mais diversas histórias.
Mas não é só nos reveses da vida que a sua acção se faz sentir. A sua participação em manifestações de carácter cultural e social é também digna de menção e reconhecimento de todos nós. Em 1940, quando o transporte de feridos e doentes era encarado como uma prioridade por aquela associação humanitária, a Junta de Provincial da Estremadura cedeu-lhe, a título gratuito, um automóvel, com o fim de ser adaptado a auto-maca.
No que respeita à representação dos Bombeiros, logo apôs a aprovação dos estatutos, havia que pensar num “emblema” que distinguisse aquela corporação. Com as sugestões de Afonso Dornelas, da Associação dos Arqueólogos Portugueses, expressas, com o exemplar propriedade no brasão adaptado pela Liga dos Bombeiros Portugueses, foi criado para esta corporação o seguinte distintivo: “Brasão da então Vila de Peniche, sobreposto a um troféu, constituído por dois machados cruzados em aspa, e o conjunto suportado por uma fénix, de usas soltadas. Sotoposto ao escudo, um listel com uma legenda: ‘VIDA POR VIDA’ Bandeira com o fundo esquartejado: o primeiro e o quarto a vermelho; o segundo e o terceiro a preto.”
Também para vincular a sua representação cm cerimónias diversas, havia que mandar fazer um estandarte, Assim, foi convidada Isabel Ribeiro Artur a constituir urna comissão de senhoras para colaborarem na obtenção de fundos para aquele efeito. Foi na devida altura encarregada da elaboração do trabalho Beatriz de Sousa Tavares, natural de Peniche e residente cm Lisboa, pessoa cujos méritos em trabalhos daquela natureza eram sobejamente reconhecidos no nosso meio, autora que já era do estandarte municipal. Em Novembro de 1940 é recebido com grande júbilo a notícia de que a autarquia, da presidência de Luís Pedroso da Silva Campos, resolvera mandar instalar um telefone fixo, naquela associação, sem encargos para a colectividade.
Continuava-se por todos os meios e acções a adquirir verbas para satisfazer as despesas correntes em especial com fornecedores. A direcção, em sessão ordinária de 6 de Janeiro de 1941, propôs para se entrar em negociações de arrendamento do armazém com o seu proprietário José Gago da Silva, que possuía na Travessa de Nossa Senhora da Conceição, onde foi a sua fábrica de conservas.
Pretendia esta entidade explorar aquele espaço com bailes no Carnaval, cuja época festiva se aproximava, em virtude de já se ter aceitado a proposta do Grupo de Jazz “Os Luziados” de Peniche, por tempo indeterminado. Foram longos os anos que esta colectividade ali teve os seus divertimentos com recinto para bailes com bar. Chegou aos nossos dias aquele espaço de divertimentos público com a designação de “os bailes do Esfrega’.
Em 1943, coma devida autorização do proprietário do imóvel, António Andrade, onde funcionava a Sede dos Bombeiros, foi possível alterar a fachada, rasgando o portão da entrada principal, para poderem entrar os meios de transporte, de modo a ficarem mais bem acondicionados e ao mesmo tempo resguardados das intempéries. Também em Maio de 1944 os consórcios Joaquim Guilherme Fana Júnior e Luís Gonzaga Ferreira Correia Peixoto, ambos industriais de pescarias, ofereceram para ser montada no telhado da sede uma sirene, Ficou assim dispensado o auxílio do sino grande das torres das Igrejas de São Pedro, Nossa Senhora da Ajuda e Nossa Senhora da Conceição, de que permanentemente pendiam cordas para o exterior, com a finalidade de serem usados para alarmes quando ocorriam situações carentes da intervenção dos bombeiros.
Recordo aqui e presto a minha devida homenagem a Salvador das Neves, por exercer as funções de contínuo da sede, a partir de Setembro de 1948, que se prolongou por mais de três décadas, em substituição de Gabriel Pinto Vitorino, que foi um servidor exemplar, que la além das funções para que foi destinado, sempre pronto a servir e estimado por todos os elementos que constituíam aquela Casa Humanitária. A 11 de Dezembro de 1949, chegou a Peniche a nova automaca para ser entregue a esta associação, por deliberação da mesma entidade de 6 de Novembro do mesmo ano, tendo sido convidadas as entidades oficiais, o pároco os sócios e a população em geral.
Foi a partir do dealbar da viragem do segundo quartel do século XX que a direcção constituída por Alberto Monteiro de Proença (presidente), Aníbal dos Santos (secretário), Aires Henriques Bolas (tesoureiro) e António da Conceição Bento (vogal) quiseram honrar alguns dos seus soldados da paz no dia do 21° aniversário daquela corporação acompanhado de um beberete, conceder medalhas de prata, de bom comportamento, aos seguintes bombeiros: Manual António Malheiros, com 21 anos de serviço; António Belarmino Machado, vulgo António Serafim, com 16 anos de serviço; Inácio Luís Seia, com 21 anos de serviço; Luís da Costa, vulgo Luís .Caseiro, com 18 anos de serviço; José Rosado Rio, com 21 anos de serviço.
Depois de 30 anos de plena actividade, em que estiveram no Comando dos Bombeiros Paulino Pereira, segundo-comandante da Corporação dos Bombeiros Voluntários de Torres Vedras e comandante-honorário da Corporação de Peniche, António Adelino Gomes da Silva, Domingos Junqueira Fernandes Félix Pilar, António Alves, Joaquim de Paiva, Alberto Monteiro de Proença e Manuel António Malheiros, entrou ao serviço da corporação como seu comandante, em Novembro de 1958, Luís Filipe Jordão Vidal de Carvalho, funcionário corporativo, natural de Peniche, homem dinâmico, com os seus 30 anos de idade, cheio de boa vontade de servir e de acertar.
A corporação sentiu desde logo o seu entusiasmo e a humanitária colectividade viveu um salutar remoçamento, promessa dum regresso aos tempos em que os voluntários de Peniche lograram um crédito que os guindou a invejável altura, renovação que saltava aos olhos dos que de perto acompanhavam a vida da instrução. O interesse de então não somente se manteve mas foi avolumado, mercê de um querer forte, secundado par toda a corporação. A 23 de Julho de 1961, na presença do ministro das Obras Públicas, Arantes de Oliveira, bem como de um representante do ministro do Interior (actual Ministério da Administração Interna) e delegações de dez corporações deste distrito, fossem benzidas, em frente da sumptuosa Igreja de São Pedro, desta então vila de Peniche, três novas viaturas: um auto-tanque pronto-socorro, uma ambulância e um “jeep’ Tiveram como madrinhas dos respectivos veículos, respectivamente, Mariete Monteiro Dias Bento (esposa de António da Conceição Bento), Dulce Freire Vidal de Carvalho filha de Luís Filipe Jordão Vidal de Carvalho, e Maria da Glória Salvador Henriques, esposa de Aires Henriques Bolas. Também no mesmo dia foi inaugurada a Casa Escola no logradouro do futuro quartel, nas imediações da Rua do Martinho Foi dada aquela construção como pequeno reconhecimento o nome de António da Conceição Bento, em actividade na presidência da Câmara Municipal na época.

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